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quarta-feira

"El Orfanato": amor de mãe


Ano: 2007
Realização: Juan Antonio Bayona
Argumento: Sergio G. Sánchez
Fotografia: Óscar Faura
Montagem: Elena Ruiz
Música: Fernando Velázquez
Elenco: Belén Rueda, Fernando Cayo, Roger Príncep e Geraldine Chaplin
IMDB


Já é conhecido o actual estatuto de terra prometida do cinema de género europeu que nuestros hermanos representam e “O Orfanato” é mais uma prova brilhante dessa constatação. Se ultimamente só se tem falado do fenómeno “[Rec]”, a nova pérola vinda de Espanha não é o filme de Jaume Balagueró e Paco Plaza mas sim esta história de fantasmas e de casa assombrada, aparentemente demasiada clássica, e que se revela um melodrama introspectivo e emocionalmente avassalador sobre a morte da nossa criança interior e o luto particularmente doloroso que a mesma nos impõe.

Uma solidez clássica

À partida, “O Orfanato” poderá relembrar de forma prejudicial filmes relativamente recentes como “The Others – Os Outros” de Alejandro Amenábar ou “Frágeis” de Jaume Balagueró, sendo os evidentes pontos em comum uma heroína feminina, uma instituição assombrada e fantasmas de crianças que morreram de forma violenta.

Mas também poderemos citar “Nas Costas do Diabo” de Guillermo Del Toro, atendendo a que o genial realizador mexicano do “Labirinto do Fauno” é aqui produtor e a influência do seu universo tão particular, caracterizado por um olhar directo sobre o sofrimento, a anormalidade, o terror infantil e a Morte, é inegável.

Todavia, o jovem Bayona, estrela em Espanha pelos seus videoclips e premiado por algumas das suas curtas-metragens, soube utilizar todos os códigos inerentes ao género para desenvolver uma estrutura e uma diegese clássica de filme gótico de casa assombrada e assim melhor tornear o que o espectador espera de um filme desse tipo.

Citamos várias influências recentes há pouco mas o estilo clássico de Bayona e a sua mestria visual discreta levam-nos mais atrás no tempo, onde as referências incontornáveis são obras-primas como “Os Inocentes” de Jack Clayton (1961), “Rosemary’s Baby – A Semente do Diabo” de Roman Polanski (1968), “Full Circle” de Richard Loncraine (1977), “La Residencia” de Narciso Ibáñez Serrador (1969) e, directamente citados no filme, “The Haunting – A Casa Maldita” de Robert Wise (1963), com a cena do monólogo interior, e “Poltergeist – o Fenómeno” de Tobe Hooper (1982), com a sessão de espiritismo.



Aparências enganadoras

Utilizando inteligentemente estas referências para criar um universo próprio onde transparece de forma progressiva uma sensibilidade fora do comum, o cineasta fez na realidade de “O Orfanato” um falso filme de casa assombrada e um verdadeiro drama psicanalítico que subtilmente vai deixando de lado os efeitos de terror já mais do que explorados pelo género para nos falar directamente ao coração.

É essa característica que dá um toque especial ao filme e o transporta para além do seu estatuto de filme fantástico, entrando na esfera dos filmes de género com vários níveis de leitura. Se o cinema de género espanhol tem marcado tanta diferença em comparação com as tentativas europeias de outros países é porque os cineastas ibéricos têm levado a cabo uma verdadeira reflexão sobre esse mesmo cinema de género, procurando sempre quebrar os seus limites e recheando os seus filmes de questões existenciais pertinentes e universais.

Juan António Bayona insere-se portanto de imediato na categoria dos seus ilustres compatriotas, o seu universo ganhando pontos de contacto com o grande Nacho Cerdà, cineasta que traumatizou toda a gente o ano passado com o seu negríssimo e reflexivo “Os Abandonados”. Para além de um percurso inicial parecido, Bayona disserta da mesma forma intensa e intimista sobre o luto e o impacto da Morte, as introspecções, as tomadas de consciência, basicamente tudo o que compõe a nossa identidade e o nosso estatuto de ser humano.

Portanto, “O Orfanato” é daqueles filmes que são muito mais do que aparentam. A inteligência do argumentista Sérgio Sánchez, que assina aqui o seu 1º argumento, e do realizador é precisamente encobrir essas veleidades autorais profundas pela capa do classicismo, tanto em termos visuais como narrativos.



O esplendor do drama intimista

O filme avança mascarado, à semelhança da figura fantasmagórica de Tomás, destilando com parcimónia um ambiente perturbador e umas cenas de terror eficazes (inclusive uma cena gore inesperada e uma cena de jogo de Macaquinho de Chinês que ficará muito tempo nas nossas memórias) que fazem com que o espectador pense estar em terreno conhecido. No entanto, pouco a pouco, o filme vai se revelando à medida que o ambiente fica mais intimista e que o terror deixa o lugar à empatia e ao sentimentalismo, para explodir num dos clímaxes mais poderosos dos últimos anos a nível emocional.

Não ficando nada atrás dos filmes de Guillermo Del Toro, Jaume Balagueró ou Nacho Cerdà, “O Orfanato” é daquelas pérolas que não deixam dúvidas sobre a superioridade do cinema de género, demonstrando uma coerência narrativa exemplar na sua mistura entre realidade e fantasia, um rigor formal constante com grande fluidez de câmara e segurança de quadro e uma deferência indispensável para com o género na sua fé nas personagens, na história, no ambiente e nas temáticas abordadas. Tendo ainda em consideração que se trata de um 1º filme para o realizador, o argumentista e grande parte da equipa técnica, “O Orfanato” é um autêntico golpe de mestre com mais maturidade do que a maioria dos falsos filmes de género que têm estreado nas nossas salas, nomeadamente essa horrenda epidemia de remakes americanos de filmes de terror estrangeiros.

Portanto, já sabem o que é que vos resta fazer dia 19 de Junho, ir ver “O Orfanato” no cinema mais próximo, esperando-se que o filme seja distribuído como deve ser, e não deixar que um filmaço destes, tão tocante emocionalmente e tão estimulante intelectualmente, passe injustamente despercebido em Portugal. ‘nuff said!

14/06/2008

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